De tão banal que se tornou ninguém parou para reparar nas tristes coincidências que culminaram com o assassinato de Ruas. Na verdade ninguém parou tampouco para socorrê-lo enquanto era covardemente espancado. Mas eu preciso tirar um tempo para te contar sobre essa história....
Do domingo de Natal dois jovens "de família" vinham de uma festa de família - crivo dos jornais. Dois jovens, que talvez, tivessem bebido demais - para esquecer os problemas. Jovens como nós! Brasileiros como cada um de nós. Resolveram urinar em um jardim. Na verdade foram mijar em um lugar isolado. Quem nominou tal espaço de jardim? É espaço público e eu pago impostos -pode ter sido a crença expressa naqueles cérebros alcoolizados. Não sabiam que aquele lugar público era um lar - um inglório espaço/lugar de existência de um morador de rua. O que é um morador de rua?! Escória; escória - seres indignos que poluem nossa sociedade. Com um agravante: era um travesti.
Preciso recapitular mais uma vez: dois jovens de família voltavam de um natal em família. Penso que no metrô falavam sobre roupas de marca, sobre as "minas"; por que não sobre sonhos e corrupção? Quem não garante que não haviam discutido sobre os rumos da nação? Só podemos especular. Então numa noite de Natal eles são ADVERTIDOS por um travesti que é morador de rua... Sim! Um homossexual que carrega duas chagas sociais: ser pobre e homossexual. Somado a sua condição social, ousou determinar um território sem paredes, sem logradoros sob seu CPF. O repugnante travesti errou em desejar ter um lar tão atípico como ele. Quem sabe imaginou que o espírito natalino transbordaria do "coração" daqueles jovens de família. Por quê?? Porque não é muito considerar que ter uma família para ceiar no Natal nos toque ao ponto de nos sentirmos abençoados, coisa que Brasil não tinha. Sim... O travesti chama-se Brasil. Infelizmente a história nos conta que ódio, tão somente ódio transbordou naquela fatal noite de Natal. Brasil foi perseguido.... Não só ele mas como outro travesti que buscou socorrer Brasil. Agora eram dois alvos. E aqueles jovens eram a combinação perigosa: álcool, preconceito e intolerância. Eles queriam causar dor. Mais adiante um tal Ruas nem imaginava que horas depois morreria. Era mais um sem rosto. Era mais um comum. " o tiozinho da bala" - na máxima: é bem um acomodado que não quis estudar para crescer e ser alguém. Ruas era a personificação da bondade brasileira... Ele é a cara que tentamos ignorar! Ajudava a alimentar os moradores de rua - como Brasil. Eram seus amigos.
Talvez Ruas não tivesse tempo e quem sabe nem tivesse um smartfone para compartilhar sua preocupação sobre o Brasil. Talvez recebe facilmente um rótulo de alienado por não discutir aqui no fb sobre os problemas estruturais do Brasil... Talvez não tivesse um celular bacana por ter de separar umas moedas para alimentar sua família e sua outra família, onde Brasil poderia ser a jardineira... Ruas taça muito ocupado em ser cidadão... Não era digno! Acho que nem tivesse a competência para elaborar um texto com SENSO CRÍTICO.
Gosto de pensar que ele estivesse contando as moedas para elaborar uma ceia e então está preso a consequência de ter desejado ajudar um amigo. Apenas um amigo... Não é travesti, não é morador de rua, tampouco um viado ou uma bichinha qualquer! Ruas ajudava um amigo... O mesmo amigo que recebera uma humilde quentinha de Natal. Não demorou para estar no chão! Dois jovens de família movidos por um ódio pode facilmente derrubar um Senhor com coração nobre. Mas vamos parar de falar em coração, pois a cabeça foi o alvo...
E no dia que o país cristão comemora o Nascimento de Cristo, Ruas assumia um rito de Páscoa - morria por dois inglórios. Um Cristo do metrô... Talvez tenha perdido a consciência antes mesmo de entender porque apanhava. Enquanto apanhava ninguém ousou intervir... Ninguém teve coragem para acudir Ruas. Uma leitura rápida diz que é o medo da população, mas não.... Ruas morreu porque era um qualquer! Que falta faz no mundo um "tiozinho das balas"? Se fosse ao menos um bebê ou um cachorro abandonado.... Velho, pobre e preto tem aos montes.
Anos atrás jovens ricos queimaram um índio em Brasília e no ano passado um outro índio morreu nas mãos de jovens como nós... Jovens de família. Eles foram presos e revolta muito. Nos toca sabe e o senso de justiça nos pede que sejamos enérgicos. Daí você se depara com um presídio, o lugar onde mandamos as pessoas ruins, tendo uma rebelião que viraria assunto mundial pela carnificina. Assassinato com requintes de crueldade... FDN X PCC, diz o jornal. No fb uma guerra é travada (porque nós temos smartfones) e uns comemoram e até consideram que seja providência divina e outros solidarizam-se com a dor da famílias.
Não eram anjos - disse o sábio Governador, mas estavam lá pela promessa de recomeço. E aqui as histórias se cruzam: a sua história, a minha história, a de Ruas e seus assassinos, bem como a dos vencedores e perdoredores da tragédia nos presídios amazonenses. Há um ponto de vista! Os assassinos de Ruas acreditavam que estavam contribuindo para erradicar a sujeira das ruas de São Paulo, sujeitos encarcerados como cães atacaram como ataca qualquer animal que marca um território. Nós lindos, civilizados e cultos matamos por tão pouco nas redes sociais...
Quantos decaptam com a idéia de bem X mal? Quantos não travam infrutíferas batalhas por conta de uma utópica guerra santa para impor visões ideológicas. A verdade é que somos todos hipócritas! Estamos na segurança de nossos lares e não vivenciamos o medo de policiais que são coagidos por um desejo de mundo melhor.... Desconhecemos a desumanidade dos presídios e tampouco podemos dimensionar o sofrimento daqueles que não tem proteção. Estamos falando de vidas e se o caminho é a pena de morte, que ela seja avaliada pela democracia. Visões como estas matam Ruas anônimos. Visões rasas como esta permitiram que um travesti fosse perseguido em Sampa. E se é lei que queremos é advogamos pela lógica: matou tem que morrer, sempre criaremos vítimas e assassinos.
Que as leis sejam mais duras mas que também sejam eficazes, mas enquanto na Europa desativam presídios, nós temos que pensar em como aumentar o número de terras para plantar soja e construir cadeias. Criminoso bom é aquele que responde por seus atos e não tão somente é esquartejado aos olhos cúmplices do Estado. E fica a mensagem de Ruas... Menos likes e mais humanidade.
TEXTO: ROCKSON COSTA PESSOA
IMAGEM: Notícias UOL.
De um lado da sala alguns choram seus mortos. São corpos jovens,
velhos… Há crianças também! São invólucros de sonhos dissipados – são
cascas sem recheio algum; não há mistério. Do outro lado da rua, são os
olhos divertidos que fitam o novo ser – é um bebê que inunda tudo com
sua ingenuidade! Representam sonhos e esperanças “… Como não se comover
com eles e como não sensibilizar-se com os que bruscamente são tomados
de nós. Independentemente se encerra-se
ou inicia-se uma vida, é preciso estar atento, melhor, estar sensível
para as pausas que a vida dá. Cada morte e cada nascimento são marcos de
um tempo entrelaçado – são as histórias que passam a existir em nós
mesmos. Nunca morrem.
O problema é que nada mais vemos… Nada mais enxergamos! E não se exige tanto assim. É o sorriso tímido de uma senhora que adentra a uma loja e que fita você – por que não sorrir de volta? É um ex aluno que lembra de você em determinado centro da cidade – para que fingir não reconhecê-lo? Mas a sensibilidade também nos faz enxergar o ódio, a inveja de tantos e tantos. Será que não percebem que é tão nítido? São sacos vazios – logo; logo serão levados pelo vento de suas próprias iras! Há muito ódio no mundo, isso é indiscutível! Há rancor gratuito em tantos e tantos – se exaltam e demonstra a feiura que os torna o que são.
Eu particularmente aprendi a me afastar de “ligeiros agressores” - aprendi a respeitá-los e a compreender suas feridas… Mas não se pode domar monstros! Não se pode tranquilizar demônios alheios. É papel de cada um o “domar” de suas iras, o enfrentar de seus demônios e o franco aperfeiçoamento de suas singularidades… Cada de um de nós tem esse dever! É comprometimento moral não?
Seja em sala de aula, seja na cantina ou no cinema com um amigo… Seja onde estiver e no tempo que vier a ser, sinta a pausa da vida! Chore, ria, ame… Respeite! Se cale, por que não? Escute e veja o quão frágil você é. A vida nunca foi segurança e a morte nunca foi um fim! Há um gigantesco e elaborado ciclo… Estamos presos uns aos outros! Iluminamos e dividindo o mesmo céu e tal qual astros, há um tempo fugaz.
Os olhos, sempre são os olhos… Ou estão cerrados ou nos fitam de modo incompreensível! São como ponteiros que mensuram nossa existência. Os mantenha sempre bem abertos… Preserve-os. Fica o convite: menos ira e mais compreensão – menos arrogância e mais consciência! Menos inveja e mais apreciação. Por que um dia retomaremos a pausa que coincidiu com nossa própria existência, mas uma pausa de fim.
O problema é que nada mais vemos… Nada mais enxergamos! E não se exige tanto assim. É o sorriso tímido de uma senhora que adentra a uma loja e que fita você – por que não sorrir de volta? É um ex aluno que lembra de você em determinado centro da cidade – para que fingir não reconhecê-lo? Mas a sensibilidade também nos faz enxergar o ódio, a inveja de tantos e tantos. Será que não percebem que é tão nítido? São sacos vazios – logo; logo serão levados pelo vento de suas próprias iras! Há muito ódio no mundo, isso é indiscutível! Há rancor gratuito em tantos e tantos – se exaltam e demonstra a feiura que os torna o que são.
Eu particularmente aprendi a me afastar de “ligeiros agressores” - aprendi a respeitá-los e a compreender suas feridas… Mas não se pode domar monstros! Não se pode tranquilizar demônios alheios. É papel de cada um o “domar” de suas iras, o enfrentar de seus demônios e o franco aperfeiçoamento de suas singularidades… Cada de um de nós tem esse dever! É comprometimento moral não?
Seja em sala de aula, seja na cantina ou no cinema com um amigo… Seja onde estiver e no tempo que vier a ser, sinta a pausa da vida! Chore, ria, ame… Respeite! Se cale, por que não? Escute e veja o quão frágil você é. A vida nunca foi segurança e a morte nunca foi um fim! Há um gigantesco e elaborado ciclo… Estamos presos uns aos outros! Iluminamos e dividindo o mesmo céu e tal qual astros, há um tempo fugaz.
Os olhos, sempre são os olhos… Ou estão cerrados ou nos fitam de modo incompreensível! São como ponteiros que mensuram nossa existência. Os mantenha sempre bem abertos… Preserve-os. Fica o convite: menos ira e mais compreensão – menos arrogância e mais consciência! Menos inveja e mais apreciação. Por que um dia retomaremos a pausa que coincidiu com nossa própria existência, mas uma pausa de fim.