domingo, 14 de outubro de 2012

Homens indigestos




O grande dramaturgo grego, Sófocles, dentro seus muitos escritos, nos relata a tragédia de Édipo. Nessa história já tão contada, principalmente nos cursos de psicologia, filosofia e sociologia; podemos extrair ricos significados, mas se existe algo que me chama a atenção nesse relato, é a figura da Esfinge.
A Esfinge representa um ser mitológico, na verdade, um monstro que tem por costume devorar homens. Ela sempre se apresenta como inquisidora, e faz uso de sua máxima: Decifra-me ou te devoro!
A história é antiga... Mas, de certo modo, ainda encontramos esfinges em demasia. Os homens se tornaram preguiçosos no pensar. Por tantas e tantas vezes tentamos incutir na mente dos alunos a postura reflexiva, buscamos instrumentalizá-los com a prudência do ouvir e analisar, mas existe uma resistência traiçoeira. Pensar e confabular não nos apetece? Penso que caminhamos fatigados em uma regularidade existencial que nos deixa resignados. E em que isso reflete? Demonstra que perdemos o dom de questionar. Passamos a refutar em vez de ponderar. Abusamos da afronta como sendo uma forma lastimosa de buscar respostas... Não questionamos! Apenas blindamos nossas incongruências, na perspectiva de abalizarmos novas formas primitivas de existir, sentir e considerar.
Somos devorados! Na forma constante e negligente, de certo que perdemos a noção da crítica e mergulhamos em um universo egoísta raso – vala comum. Nada sabemos e tampouco buscamos desvelar na realidade. De tal modo, que é comum encontramos muitos profissionais da saúde que esquecem-se de perguntar ou negam até mesmo o tocar... Fugimos do questionamento e escondemos nossas falhas por detrás de instrumentos modernos, de falas complicadas. Evitamos fitar os olhos, Por quê? Porque são os pedaços indigestos que de nós sobram. São os retalhos que nos constituem que expressam nossa deficiência em filtrar o real.
A nossa missão é essa, não a resolução final que suscitará no extermínio dos problemas, as esfinges não morrem, pois são os monstros que nos mobilizam e acabam por engendrar as diminutas e perpétuas mudanças. É nossa função descortinar os fenômenos, atribuir os reais valores aos signos que preenchem nosso campo de atuação.
Desejo que tenhamos a humildade para compreendermos que as falhas nos impelem ao crescimento. Que jamais tenhamos medo de fitar o desconhecido que se apresenta no agora. Pois ao nos depararmos com o imperativo de decifrar, nem sempre poderemos responder, mas a grandeza se faz nas tentativas, não nas resignações.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Em tempos de política



Hoje passei por uma avenida em minha cidade e me confrontei com um político que acenava para todos e todas e até para mim acenou. Não retribui, não por ausência de educação, tampouco por desgosto partidário, apenas não compreendi o porquê de tal figura em dado lugar. Mas acredito que eu esteja ignorando o fenômeno político, que permite a proliferação de candidatos, como se fossem salvadores oportunistas do cidadão.

Se existe algo que não pode ser negado, é o fato de tal período propiciar muitas mudanças, que de tão diversas, promovem até mesmo conversões milagrosas, onde agnósticos se dizem tocados por Deus e emocionam fiéis ingênuos, que nada mais são que peças de um grande trampolim eleitoral. E ainda sobre tal situação, não sei a que deve minha indignação, se ao líder religioso que uso suas ovelhas como manobra eleitoral, ou do político que se promove por conta de valores sinceros, mas que rapidamente são alterados por conta de promessas messiânicas.

Em minha capital percebemos um pleito que compreende candidatos ruins e menos piores, figurinhas repetidas que surgem como uma comprovação da não renovação política, é claro que surgem novos personagens, mas são sujeitos de uma apatia social gigantesca, sujeitos anônimos que surgem apenas como distração do período eleitoral. Vale destacar ainda, os políticos que já governaram e são esses que mais me indignam, pois possuem discursos “curativos”, mas esquecem de que muitas das mazelas hoje criticadas foram iniciadas ou agravadas em sua gestão.

Quando me debruço sobre a política brasileira e tenta encontrar mudanças, nada vejo. São as mesmas CPIs, as mesmas anulações de processo e no fim corremos o risco de sermos punidos por nossa avaliação preconceituosa desses quase anjos da política, que possuem recursos infinitos, de tal modo que confundem a cabeça do mais culto cidadão, pois no fim, sempre há uma explicação, consegue contornar filmagens evidentes, conseguem explicar desvio de verbas, são mágicos de fato.

Meu singelo conselho, se é que tenho o direito de dá-lo, é de que quando um candidato for a sua igreja peça ao mesmo que opere um milagre... Peça um sinal de que ele é mesmo o tal enviado de Deus para os conflitos modernos. E não precisa ser algo grandioso como abrir o mar, tampouco deverá morrer por você, mas que ele se preste a fazer o melhor necessário. Que formule novas políticas para a saúde, que cuide da segurança e que tenha um governo transparente. Estou cansado dessa bagunça chamada Brasil e mais descontente com os políticos do meu Estado e município, mas infelizmente há a perpetuação da pobreza e da ignorância, e isso permite que uns muitos, se contentem com ranchos sazonais e promessas espalhafatosas...

Cada sujeito tem uma história, a tal ficha limpa pode não ter emplacado na política pública, mas quem precisa dela quando faz uso de memória e bom senso? Que saibamos recordar datas, eventos e fatos que expressem a verdadeira face de nossos candidatos. Porque esperar milagres e acreditar em conversões oportunistas são a prova que tendemos a negligenciar nossa própria dignidade e cidadania.


TEXTO: ROCKSON COSTA PESSOA

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Essencialidades



Hoje recebi um carinho afetuoso, de mais sincero, ainda não experimentei de forma concreta outro de extrema pureza... O episódio em questão, se deu com meu sobrinho, Cauã, 1ano e 6 meses e muita coisa para me ensinar. Pela tarde de hoje, quando eu descansava em meio à corrida que tem sido a minha vida ele veio até mim e de modo singelo reclinou a cabeça no meio peito, algo breve e diminuto, mas tão sincero que não se pode explicar o sentimento... E como isso é raro hoje em dia! É tão raro ter essa integridade, afinal assumimos tantos papéis, funções e dogmas sociais que às vezes dormimos e acordamos com fantasias que não representam nossa realidade como sujeitos e isso machuca e entristece.

É um imperativo da nossa sociedade a anulação do sentimento, e de certo modo, existem orientações de como falar, sorrir, abraçar. Estamos presos na retina do outro, e somos vítimas dos preconceitos e dos medos límbicos daqueles que nos vigiam, mesmo por trás de belos sorrisos. Vivemos uma ditadura da apatia, do fazer em prol de uma felicidade que é utópica, pois a nossa alegria representa um ideal ainda controverso, pois o consenso é seguir padrões já legitimados por olhares e desejos do outro, não há um espaço para o Eu.

O que é essencial? Para Antoine de Saint-Exupéry, em seu livro: O pequeno Príncipe, o essencial seria algo invisível aos olhos, talvez porque os olhos se sobrepõem aos demais sentidos, ou quem sabe, pela dura realidade de que a vida para muitos de nós já se banalizou. A beleza que compõe nossos universos encontra-se bem ajustada a calendários e datas especiais. Somos regidos pelo tempo que nós mesmos oprimimos e que buscamos de modo controverso. E perdemos tanto tempo... Tanto tempo explicando as coisas que não se necessita explicar. Mas hoje tudo pede explicações, relatórios, processos e ofícios e mais alguns memorandos, a vida pessoal se confunde com o trabalho e quando percebemos já não sabemos que lugar ocupamos na hora do almoço. Complicamos mais ainda o humano já complicado... E não percebemos o adoecimento que é latente!

O carinho do Cauã, que não durou mais do que alguns segundos, representa aquilo que nós perdemos com o desenvolvimento e com a aquisição das responsabilidades, o essencial. Penso que esse é o essencial que não mais enxergamos, não porque não queremos ver, mas porque já estamos cegos. Fomos lobotomizados e estamos cegos nos sentimentos, pela necessidade de termos assumirmos armaduras, pois nos lograram dizendo que deveríamos ser fortes sempre, nos trancafiamos e deixamos as chaves enferrujarem... Colocamos o essencial num lugar sagrado, e como fugimos do sagrado e de certo modo o repudiamos, por ser muito simplista para nós seres complexos, nos perdemos ainda mais em meio a nossa confusa natureza.

Depois que me reclinou sua cabeça, o Cauã caminhou para a sala... Nada disse, porque ainda não fala, nem tampouco olhou para trás para avaliar minha expressão facial. Ele simplesmente andou do seu jeito novo de andar e foi apreendendo o mundo... Eu sei que um dia, ele irá perder um pouco dessa essencialidade, pois o rito dos homens é extorquir nossa essência verdadeira infantil, para nos programar e assim novos simulacros existirem. Porém, enquanto ele não se contamina, aprendo com ele esses detalhes que um dia também possui, e dessa forma breve e diminuta posso experimentar novas perspectivas - um sonhar acordado quem sabe, em meio ao pesadelo real da vida adulta e chata que vivemos.




domingo, 6 de maio de 2012

Felicidade Parasitária




Comumente ouvimos desabafos de pessoas acerca da tal famigerada infelicidade. Hoje tão comum e corriqueira, que já há quem veja a felicidade como uma utopia – algo pueril que encontra significado apenas no terreno do passado. Imaginar a felicidade em tal perspectiva é preocupante, pois nos coloca em uma situação cômoda de consternação, que para nada serve.
Lembro que alguns dias atrás, em conversa com professores, um deles se viu preocupado com a questão de algumas gravações realizadas em sala, que muitas vezes têm por objetivo prejudicar o professor. Quando na possibilidade de se editar o material a bel-prazer do discente. E ele comentou sobre um argumento que costuma utilizar regularmente, onde explica que a durante a gestação a criança nada mais é que um parasita, lógico que pela questão de ser um corpo estranho e por ser hóspede em outro organismo. Claro, isso é no âmbito biológico que serve como explicação didática, nada mais – porém, é compreensível o susto ou pavor de uma gestante ao se deparar com tal verbalização, pela simbologia que é coerente com o momento vivido. É uma questão de contexto, e acredito que compreender a felicidade pede a mesma lógica.
Pela fatalidade da modernidade que concebe a infelicidade como sendo um dos sintomas da nossa recorrente crise existencial coletiva, compramos a idéia! Mas e se considerarmos que essa felicidade fugaz como sendo algo artificial? Acredito que a felicidade hoje discutida tem natureza abreviada pelo simples fato de não estar em nós, todavia que comumente observamos uma felicidade cultivada além eu, como que em um padrão parasitário. Hoje nos acostumamos a sonhar os sonhos dos outros e como inquilinos, esquecemos que certos relacionamentos, não duraram mais que uma boa temporada.

 Ao consideramos a felicidade como resultante de um esforço individual e introspectivo, poderíamos de fato, encontrar uma felicidade real, não perfeita, pois a perfeição nada mais é que a própria felicidade utópica... Algo que foi criado como um subterfúgio no campo dos relacionamentos. E tal tarefa é complicada, pela própria dinâmica parasitária, não percebemos o hospedeiro, só podemos desconfiar de sua existência quando na análise de sintomas e comportamentos, logo, cabe a você se questionar a natureza do seu relacionamento, se real ou parasitária, nunca se sabe. O que é certo é que tudo aquilo que cultivamos no terreno dos outros jamais será nosso por direito.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Tapa na cara – os percalços de new educação.


No final de 2011 a lei da palmada foi aprovada com unanimidade na Câmara dos Deputados. Uma lei que busca extinguir as punições de natureza física do cotidiano dos pais e filhos brasileiros. Há quem veja com bons olhos, afinal estamos nos humanizando, outros, porém encontram brechas para um perigo sem precedentes.
Um dia desses estava conversando com minha mãe, sobre os novos modelos de se educar – essa high technology que busca ensinar a educação. E quando nos debruçamos sobre esses artifícios pedagógicos, se constata a perversidade que é. Para quem busca de fato uma educação, o caminho é feito de pedras. O que chamo de nova educação é a modalidade aplicada em nossos colégios, que busca preparar os alunos para um mercado de trabalho, e para as tão concorridas universidades públicas. E assim queremos crianças mais inteligentes, mais inteligentes e com retoques torpes de uma educação que é falha. Tudo bem! Não é culpa do colégio, afinal educação vem de casa, já diz o ditado, então piorou... Pois os pais parecem não compreender o real significado de repreensão e encontramos um campo fértil para as moléstias sociais. Quantas e quantas crianças com Transtorno de Conduta? E com Transtorno de Oposição e Desafio? Inúmeras, e o pior é que achamos que é uma birra transitória ou um mimo que não faz mal a ninguém, mas se hoje encontramos tantos adolescentes cometendo crimes e até mesmo matando pessoas é porque perdemos o controle em dado momento.
Que bom seria se educação e inteligência caminhassem juntas, mas infelizmente não é assim que acontece. Quantas crianças bem intencionadas repetem o ano inúmeras vezes e incontáveis crianças consideradas “problemáticas” avançam nas séries seguintes sem limites? O cenário educacional é feito de falhas, porque o sistema do Estado faliu. A família perdeu a essência e a igreja se tornou banal. E o que temos a partir dessas falhas? Temos um Estado impotente, jovens transgressores e uma lei que não reconhece o adolescente infrator como de fato este é. O ECA contempla um jovem das antigas, o batedor de carteira, o “cheira-cola”... Mas como aplicar um ECA em jovens com 10 mortes na ficha criminal? Como aplicar um ECA em adolescentes que são donos de bocas de fumo? É uma questão de lei.
E para somar a esses fatores sociais indesejáveis, nos cai dos céus uma lei que é boa, afinal que bom seria não dar uma palmada no filho, mas convenhamos – se o sistema é falho e se as demais estruturas sociais apresentam rupturas, como imaginar que essa lei será adequada? Não é! Por que não aumentam as verbas da educação? Por que não criam sistemas que de fato permitam uma educação eficaz? E como punirão os pais que derem palmadas em seus filhos? Tirarão-lhes as bolsas família? Vergonha. Criamos leis virtuais e insípidas que marginalizam pais desesperados e do outro lado vemos os governantes que nos roubam milhões saírem ilesos. O que nos falta são leis e programas que capacitem o povo e não diretrizes pseudopedagógicas que tentam suplantar a autoridade dos pais sobre seus filhos.
E assim continuamos prisioneiros de nossas velhas vaidades. Crianças morrem por fome e por drogas e nós criamos leis “boazinhas” para demonstrarmos números para estrangeiros nos admirarem. Mas o Brasil de fato é outro, é os pais onde jovens estão se perdendo por culpa de pais despreparados e por conveniência de um Estado inerte que aplica leis aparentemente inócuas, mas que cedo ou tarde nos causam mais chagas sociais.